Adolescente que começou a vender pudim para consertar a bike hoje é 'jovem empreendedor' com mais de mil entregas por mês
06/12/2025
(Foto: Reprodução) João Pudim: jovem de 14 anos transforma doce em oportunidade de negócio
João Pedro Maiolino Carioca tem 14 anos, adora andar de bicicleta. Pedala tanto, que a velha magrela precisou de muitos consertos, mas em abril de 2025 chegou a um ponto que não havia mais reparo possível. O adolescente, de Uberaba, no Triângulo Mineiro, até poderia pedir dinheiro para a mãe, mas naquele momento ela não tinha como ajudar.
E com esse cenário ele pensou: como resolver esse problema? Vender algum item de casa? Fazer uma rifa? Começar uma vaquinha online? E sobre uma ação entre amigos?
Nenhuma das opções acima! João, um apreciador de pudins e aspirante a confeiteiro, por mais que não soubesse disso, ainda, se lembrou de quando vendia balas na escola, alguns anos antes e decidiu que, literalmente, colocaria a mão na massa para conseguir comprar uma nova bicicleta.
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"Olha, não vou dizer que não tive um pouco de vergonha no começo, tive sim. Mas eu precisava fazer alguma coisa e o pudim sempre foi algo marcante na minha vida, então resolvi começar uma produção e ver no que dava", contou ao g1.
A mãe, Indyara Maiolino, que havia voltado a estudar, foi a primeira grande incentivadora e apoiadora. Na faculdade em que ela estudava a fama dos pudins do João começava a se espalhar, assim como na escola dele.
"Eu nunca vou esquecer da minha amiga que comprou o primeiro pudim. Foi a reação e o feedback dela que me fez acreditar que era possível chegar a mais pessoas, e comprar a minha nova bike", lembrou João.
Herança afetiva
O pudim doce como conhecemos tem origem portuguesa, era popular nos conventos e feitos com gemas de ovos, cuja receita ainda é reproduzida até hoje. Mas foi no Brasil, com a chegada do leite condensado, que ele se tornou uma das sobremesas mais apreciadas do mundo.
João acredita que seu dom vem da bisavó. São memórias afetivas que moldam o jeito carinhoso — e ainda tímido — com que ele trabalha. Cada pudim carrega um pedaço dessa história da família.
"Tinha pudim até no café da manhã, eu comeria a qualquer hora. Então, essa coisa boa virou o meu propósito".
Ele começou a investir na produção da sobremesa e foi com a ajuda de uma amiga da mãe que mora em Rondonópolis (MT) e é confeiteira, que os pudins do João começaram a tomar forma e gosto.
"A gente conversava pela internet e ela me dava dicas sobre como achar o ponto certo da massa, como montar, desenformar. Vou te contar, no começo eu fazia uns pudins bem feinhos", brinca. E assim, João foi testando e a cada novo aprendizado, um novo produto, um novo projeto e, claro, algumas receitas engavetadas também.
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João Pedro, o "João do Pudim", jovem empreendedor de Uberaba
Rapha Diniz/Divulgação
Tem pudim de quê?
Se você estiver com fome, recomendo que pule o próximo parágrafo. Enquanto testava várias receitas, João desenvolveu outras com sabores que agradam um perfil super variado de clientes.
Os ingredientes vão na calda ou na própria massa do pudim, depende da receita. Além de porção individual, 500g e 1kg, tem opções de pudim no copo e também embalado para presente, chegando a um novo nicho que percebeu que pode atuar, o das lembrancinhas para festas e eventos.
Atualmente, no cardápio encontramos:
Tradicional: o clássico pudim "raiz" com leite condensado, coberto com calda de caramelo dourada;
Café: um pudim intenso para dar mais energia, feito com café blend especial e coberto com calda caramelizada;
Chocolate branco e frutas vermelhas: o match perfeito feito com chocolate branco, calda de frutas vermelhas frescas e um toque acidulado para equilibrar a doçura;
Manjar: pudim de coco cremoso com flocos e lascas de coco fresco, coberto com calda de caramelo finalizado com ameixas;
Romeu e Julieta: um clássico repaginado, com massa feita com cream cheese e finalizado com calda cremosa de goiaba artesanal;
Figo: calda de caramelo e figos marinados no conhaque.
Na cozinha, João aprendeu a conviver melhor com o TDAH
Concluindo o 7º ano do Ensino Fundamental, João vai à escola todas as manhãs de segunda a sexta-feira e tem uma rotina cheia: produz pudins quatro dias por semana, anda de bicicleta, joga futebol, faz terapia e ainda acompanha seu time do coração, o Flamengo. Entre tantas atividades, foi na cozinha que encontrou um ponto de equilíbrio.
João sempre foi uma criança muito ativa, conta Indyara. "Mas eu percebi, entre 6 e 8 anos que ele era mais hiperativo que as outras crianças da idade dele. Na escola tinha dificuldade na leitura e para entregar algumas tarefas."
A mãe procurou ajuda de especialistas e João recebeu o diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH).
Com o atendimento e acolhimento adequados, segundo a mãe, além de melhorar na escola, o foco dele foi determinante no sucesso no ato de cozinhar. O pudim entrou na vida dele como um refúgio, uma atividade leve, que o ajuda a organizar pensamentos, movimentos e emoções e se transformou em um negócio de família.
É um aprendizado diário para a vida. "Tem que ser algo leve, sem pressão pra ele que é um adolescente como qualquer outro. João encontrou o hiperfoco na produção do pudim. Ele gosta de fazer, mas não gosta de embalar. Da mesma forma em que pode se sair melhor produzindo uma maquete do que numa dissertação, a gente vai se adaptando e hoje ver o desenvolvimento dele é meu maior orgulho".
Produção mensal ultrapassa mais de mil pudins
Desde que a amiga provou o pudim e disse “Você podia vender isso!”, João se esforçou para não decepcionar seus clientes que aumentavam a cada semana. Ali nascia, silenciosamente, um pequeno negócio que há alguns meses ficava na casa dos 200 pudins por mês.
A dedicação, carinho e preocupação com a qualidade de João tem levado a maior visibilidade de sua produção. Em outubro, foram entregue 1.398 pudins, entre tamanho tradicional e outros formatos menores.
Os pedidos, feitos pela rede social ou aplicativo de conversa, chegam de várias regiões de Uberaba. Na bike comprada com a receita do doce, ele faz as entregas mais perto de casa e já ganhou até a bag de uma empresa de delivery. A mãe faz entregas que são mais longe de carro. Eles já conseguiram também uma parceria para entregar em Araxá, há cerca de 110km de Uberaba.
Colhendo os frutos
A história de João é inspiradora e na cidade natal ele deu sua primeira palestra, participou da primeira feira de gastronomia, conquistando um terceiro lugar. Na quermesse da igreja além de levar um pudim do João, todo mundo queria queria tirar uma foto com o jovem e simpático confeiteiro.
Menos de um ano após o início empreendedor, João já faturou o suficiente para comprar uma geladeira vitrine, um forno industrial para pudim, um tênis, e claro, uns apetrechos para deixar a bike mais estilosa. No evento em que palestrou, vendeu 500 pudins, ou seja, o stand conseguiu zerar as contas do mês.
"Ele investe no negócio, e tem variado, agora tem até pudim no pote para dar como lembrancinha de aniversário, por exemplo, já temos encomendas e a previsão é que até o final do ano, com as produções de Natal, a gente consiga dobrar o faturamento que tivemos até agora", disse Indyara, que além de mãe foi promovida a sócia.
João disse que um dos momentos mais felizes nessa ano foi quando conseguiu pagar o primeiro salário pra ela.
João conta ainda que por hora está juntando mais dinheiro para continuar a investir em equipamentos de cozinha, mas conseguiu separar uma parcela para realizar um sonho.
Indyara Maiolino e João Pedro
Arquivo Pessoal
"Vou fazer o meu primeiro curso de culinária e confeitaria. Vai ser em São Paulo, já paguei a inscrição e estou super animado".
E vem mais por aí
No ano em que estreou como empreendedor João tem como palavra chave gratidão. Ele foi convidado para participar da programação de Natal da cidade de Uberaba, estará junto com o presépio vivo no Paróquia São Geraldo Majela, no bairro Alfredo Freire.
Para o Natal, ele tem a colaboração de uma tia no cardápio com bombons com castanho e camafeu, mas os pudins ainda reinam! João está está super animado para levar mais doçura para muitas famílias numa das épocas mais saborosas do ano.
A bicicleta que precisava de conserto ficou para trás e agora João pedala em uma direção bem maior: a de um jovem empreendedor que transformou uma necessidade em afeto, e o afeto em oportunidade.
"Eu ainda não sei exatamente a faculdade que vou cursar mas é certo que os pudins estão no meu futuro sim. De repente também posso fazer algo que ajude também na administração do negócio com a minha mãe, mas o que mais quero é continuar feliz com o que faço".
João Pedro, de 14 e a bicicleta que comprou com a renda gerada pela venda de pudins
Indyara Maiolino
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